terça-feira, 10 de maio de 2011

Um pouco sobre Darcy Ribeiro



Darcy Ribeiro foi uma das grandes e das mais importantes figuras da história e da política do Brasil. Antropólogo, escritor e político, Darcy ficou conhecido por sua dedicação à educação e aos índios no país.
As entrevistas abaixo mostram um pouco da personalidade de Darcy, bem como seus ideais políticos e sua visão sobre o desenvolvimento político e social do Brasil.
A primeira é um trecho de uma das entrevistas publicadas no livro "Memórias do Presente/100 Entrevistas do Mais!", da Publifolha (http://publifolha.folha.com.br/catalogo/livros/135723/); e a segunda se trata de uma entrevista exibida em abril de 1995 no programa Roda Viva, no qual Darcy lançava dois novos livros: O povo brasileiro e O Brasil como problema.
           
Darcy Ribeiro
Trechos da entrevista concedida à Folha feita por Marcos Augusto Gonçalves em fevereiro de 1995:

Folha - Por que o interesse inicial pela medicina?
Darcy - Acho que por ter um tio médico, com status muito grande. Fui para a Faculdade de Medicina, em Belo Horizonte, aos 17 anos. E ao chegar lá me encantei. Vinha de uma cidade pequena e as discussões políticas da grande cidade me fascinaram. Era o Estado Novo, 1940, os integralistas querendo me conquistar de um lado, os comunistas, de outro. Não entendia o que acontecia. Minha primeira opção política foi pelo comunismo. O Prestes estava preso, era um herói. A biografia do Prestes pelo Jorge Amado teve um grande efeito sobre mim. Passei a frequentar aquilo ativamente. Um dia descobri a Faculdade de Direito e de Filosofia e passei a fazer mais cursos nessa área do que na Medicina. Lembro que o único sábio de Belo Horizonte, que era Carlos de Campos, um filósofo formidável, me recebia e conversava comigo. Eu tinha 18 anos. Li um livro de divulgação de filosofia e fiquei encantado. Montes Claros nunca teve um Sócrates, nem Belo Horizonte! O fato é que durante três anos eu tomei bomba em Medicina. E pensava seriamente em me suicidar. No diário daquela época escrevi: "Não decidi que ia nascer, decido hoje se vou viver". Até que eu "induzi" um poetinha que tinha lá, de costeletas, a se suicidar. Dizia que ele não tinha valor, que ele não tinha peito para se suicidar. E ele se suicidou. Então eu escrevi no diário: "Fulano se suicidou por mim, eu posso deixar disso". Isso mostra a brutalidade de um jovem de 19 a 20 anos.

Folha - Como era o ambiente na Universidade de São Paulo?
Darcy - A escola tinha um grupo forte. Estavam por lá o Lévi-Strauss e o Radcliffe Brown (sociólogo inglês, 1881-1955), as duas maiores figuras mundiais da antropologia. Foi, portanto, um curso da mais alta qualidade. São Paulo foi que me catapultou. Se eu tivesse ficado em qualquer outro lugar do Brasil, não teria optado por ir para o mato, viver com os índios. São Paulo me deu ideais científicos.

Folha - O sr. conheceu Mário de Andrade?
Darcy - Tenho um caso curioso com ele. O paulista mais interessado em etnologia, o mais inteligente e vivo, o que eu mais admirava, era o Mário de Andrade. Um dia, marquei um encontro com ele, na livraria Jaraguá, na rua Marconi. Era uma livraria com casa de chá. Estava me preparando para a pesquisa de campo, tinha muitas perguntas a fazer e muito o que ouvir. Cheguei muito entusiasmado, mas para minha decepção, Mário estava sentado com dois inimigos: Germinal Feijó e Paulo Emílio Salles Gomes. Dois trotskistas. Os comunistas eram proibidos de falar com trotskistas. Eu tinha raiva de trotskistas. Depois, o Paulo Emílio veio a ser grande amigo meu, me ajudou a construir a Universidade de Brasília. Mas naquela fase eu tinha raiva. E acabei não falando com o Mário, que era a pessoa com quem eu mais queria ter falado. Logo depois ele morreu.

Folha - Quem mais o influenciou na época?
Darcy - Havia um professor alemão, Herbert Baldus. Ele teve muita influência na minha formação. Foi ele quem me empurrou para a carreira de etnólogo. Era um alemão atípico. Passou a Segunda Guerra em São Paulo. Era poeta.

Folha - O sr. teve contato nessa época com o Lévi-Strauss?
Darcy - Muito longínquo. Assisti conferências. O Baldus foi mais importante, inclusive para outros colegas, como o Florestan Fernandes. Ele nos empurrava para a pesquisa de campo.
(...)

Folha - Como foi seu encontro, posteriormente, com o Lévi-Strauss, em Paris?
Darcy - Foi uma coisa gozada. Eu tinha publicado meu livro "O Processo Civilizatório". Mandei para ele e depois fui procurá-lo para saber o que tinha achado. Ele respondeu: "Me interessou" --com um muxoxo. Eu disse: "Mas mestre, o que é isso, esse livro me custou tanto esforço, o senhor não pode me dar uma opinião?" Ele disse: "Não, não. Essa obra teórica sua e minha é bobagem. Você é um príncipe dos observadores, sua etnografia é ótima, por isso uso muito os mitos que você colhe. Quem pode fazer isso deve fazer isso, ficar estudando os índios". E eu rebati: "E você fazendo a teoria?". Ele disse: "Não é nesse sentido, minha obra teórica não vai durar 20 anos. O importante é a etnografia". Eu saí muito puto com ele, porque era uma divisão de trabalho que eu não aceitava.

Entrevista concedida ao jornalista Matinas Suzuki no programa Roda Viva em abril de 1995:
A seqüência da entrevista está disponível nos links:
Final



Texto: Priscilla Santos
Postado por Camilla Alves

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